quinta-feira, 18 de agosto de 2016





Flores azuis opiáceas cravadas no tecido branco da amplidão. Cravadas em mim. Explosões anis, pétalas de consciência. Uma felicidade que se desdobra como a primeira luz do mundo vista pelos cegos.
Não soube, nem sei, como lidar com a tua gentileza noturna. Eu, Sol Negro. Tu, luz selena que me tocou a face com delicadeza, me faz descobrir nas trevas mais profundas a réstia de luminosidade que me preenchia o sentido. Que me rasgava de tanta beleza. Êxtase! Adoração. Como se eu tivesse te deixado guardando minha luz pelas eras, plenilúnios e solsticios milenares, para enfim me devolveres a luz nesse dia. Eu, Sol Negro, era enfim re-iluminado. Beijar os principados lunares. Pedras cósmicas. Ecos infindos desse toque. Apoteose. Como se um Deus antigo reconhecesse outro através desse nosso olhar deificante. Depois de percorrer as estepes do mundo, áridas, gélidas, hostis - Eu, exausto, velho como o mundo - encontro, marejados os olhos, a beleza. O júbilo do cão de Ulisses. A materialização dos 7 Céus, o presente final do Deus Tengri. Uma flor que brotou na tundra. A Primavera que existe, a insistência da vida de brotar no gélido, no seco, no inóspito. Todo significado contido na insistência de se fazer existir em meio a tempestades, as guerras dos homens e ao pó. Tua lágrima luminosa. Na imensidão do mundo, há muitas florações. Mas só esta flor veio desafiar a distância, o tempo, as hordas, a cavalgada, o aço. É a flor que rasga a desesperança. É como a flor do lençol branco com que eu te cobri nesta noite, cortando o tédio pálido como cianas espadas invasoras. Não é só a beleza dos príncipes e imperatrizes. Não é só prata, pérolas e púrpura. Não é a seda, o incenso, o tempero. Não é só o lar e o exótico distante. Nem são as pedras e os templos, os rios, os mares. Falésias e geleiras. A terra e a Montanha. O abismo, o desfiladeiro e o precipício. Os açudes, as serras, as veredas e os sertões. Não são as pastagens longínquas nem as florestas tropicais. É tudo isso e muito mais. É o espírito dos pássaros e das fontes de água límpida. São os cortes nas veias da terra, o murmúrio do Carvalho. O sopro fresco dos verdes bosques, e a arribação nas campinas. Encruzilhadas e colinas. São as pétalas de Acácia vermelha em Damasco. É o cheiro de noz moscada, o sabor da carne assada, são os altares da Birmânia e os Mausoléus de Roma. O berço dos orfãos e a canção dos enamorados. É a chuva na seca, é a água se misturando em lágrimas de felicidade. É saber nome de todas as pedras, e saber como elas são engraçadas. É o azul e o abismo dos mares. São os espelhos glaciais e os corais antárticos. É também todos os veios de ouro, minas, diamantes, ravinas e caminhos. A estrada e o sol. O calor luminoso numa manhã fria. São as flores da Mongólia, e as tulipas holandesas. A história das águas, os caminhos e os diários de todos os rios. O vento sibilante e a poeira. A geopolítica das nuvens. O silêncio dos vivos e o grito dos mortos. É tudo. E nada. Mas principalmente tudo. Esta expansão no meu peito como a disparada dos cavalos dos reis, como a tecelagem dos segredos das rainhas, como a oração sincera dos puros. Como as estátuas florentinas e os afrescos sicilianos. Uma ilha na Polinésia, um Touro em Creta, marfim etíope. Somos um eclipse que não pede desculpas por existir e se impõe lançando sombra e luz no mundo, que dançam e se entrelaçam, com todas as matizes e os contrastes, inventando novas cores e novilínguas - numa tentativa última de tentar exprimir o que é inominável. O nosso encontro. Por que você demorou tanto?

sábado, 28 de maio de 2016



A Oliveira Prismática Quando o Arcanjo Rafael soprou meu nome, me deu vida e existência. Uma sátira de realidade. Eu era inestimável, me foi dito! Eterno e intangível. Um valor distante da existência, um capricho metafísico. Não havia raiz por onde descer até chegar ao âmago da minha axiologia. Era só breu, seiva e terra. Uma vida timida e solene que se impunha, reticente, sozinha, em organicismo por entre a terra e as trevas até a luz. Não havia caminho até minha essência - eu era espectro solto no ar, uma Sirene-Ariel a flutuar sobre o que existe de fato, pois não me era alcançável tocar a minha epistemologia. Eu era uma planta anestesiada com sonhos aéreos. Todas as águias de dia, e as corujas de noite, me diziam que não havia tal coisa como a matéria, que era uma ilusão. Éramos apenas espirito, todos marionetes da promessa de transcendência vagando por lunicênios, ocasos, nuvens, púrpuras e ionosferas. Até que eu ouvi uma voz. A primeira vez que ouvi prosa ao invés de poesia. A poesia de antes era bela mas inócua, acalentava mas não supria. Eu ouvi então a voz de uma Montanha eurasiana, que dividia estepes geladas em oriente e ocidente, fendia a terra até alcançar seu ventre, na matéria mais obscura e inominável. Uma raiz de pedra que atravessou as eras e encontrou a resposta, e encontrou a luz. E depois me ensinou-a. Me ensinou tanto sobre as pedras que pesaram sobre meus sonhos aéreos e eu caí. Eu desci até o centro da terra, percorrendo o caminho inverso de sua raiz pétrea, até o útero de lava maternal, e me foi dada a dádiva de reconhecer minha existência, e eu em êxtase rasguei minha terra macia, e espremi seu conteúdo massento com as mãos, como se fosse um unguento primordial de pedra pome, ouro e safiras. E eu pude enfim ser, e experimentar a real existência como uma criança que brinca com texturas e tessituras. Ela me disse: "Reconheço que és inestimável, pois não há balança ou pecúnia que qualifique sua existência. Mas não por seres brisa, mas justamente por seres Pedra. Antônio, tu és filho da terra e das estrelas, por isso também se chamas Pedro. Tua existência não se limita ao sublime, pois és ontológico, não só onírico, e tu podes se deitar na grama e relva, e se cobrir com flores. Tu és enfim uma Pedra de valor Inestimável, Pedro Antônio. Filho dos anjos semíticos, Rafael. Nascido no monte das Oliveiras, onde se deu fim o falso Filho de um falso Deus, onde um beijo valia 30 moedas de prata ou mais. Terras de cemitério frutificam mais. Pedro Antônio Rafael das Oliveiras. Teu corte irá lapidar vontades, tuas raízes lhe darão sustentação, teu azeite iluminará o mundo num candeeiro. E podes brotar aqui no meu terreiro, brotando dos meus alpendres rochosos, tropical e mediterrâneo, latino e agreste, vencendo o inverno das estepes pela teimosia das algarobas e pela força da seiva em tuas veias. Seja fogo primordial, pedra elementar, terra onipresente, raiz profunda com flores prismáticas, vento que sussurra palavras de sacramento, luz sesciente e irmã das estrelas. Se transmute em uma Nova Constelação.

Conta dos Orixás

Conta dos Orixás Haverá um tempo de arrependermo-nos Do tempo perdido, Do beijo não dado, O desenho mal traçado, A conversa meia boca, O tampar da rolha, O acender do fósforo, O medo do escuro, Do desconhecido, Do mundo. Aquele toque recolhido, A palavra não dita, O medo do que viria - Ramificações de solidão. O tempo Passeia por nós, Perpassa os temores, Sussurra sonhos perdidos, Aflições onipotentes, Saudades. Eu e você, Querido amigo, Somos o quê? O que mais além de anos nos separam? O magnético que nos une, Íons de capricho. Tens fome de vida. Eu sou a vida. Tenho fome de ti. O que tu és? Quero teu corpo e tua essência, Quero violar teu conteúdo sagrado, Imiscuir minha essência na tua. Meu mundo velho No teu novo, Ranger de ferros E sofrer a felicidade. Nesta conta de Orixás, Quero me perder em ti. Mas o equilíbrio de tudo Nos afasta. Estamos, no carro, Juntos, Condenados à distância.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Agnes Dei - Kosmos

Agnes Dei - Kosmos

Acordar chorando sonhos
Onde se morre.
Lágrimas de felicidade.

Ignoro essa tua Alegria
De se dar um salto pra fora da Existência.
Mas as tuas sombras me alcançaram,
E eu ouvi o Sol chorar.

Quantos abismos cabem nos teus olhos?
Quanto apocalipse sobra nas minhas calçadas?
Aquelas onde te vi primeiro.

Talvez seja, no entanto,
Tua a Profecia,
E não haja torres perdidas de bronze polido
Na Antártida.

E o futuro seja o Escuro,
E o futuro seja breu,
E teu lamento seja maior que Eu,
Todas as dores do mundo.
Agnes Dei.

Ser feliz é agarrar o Sol - com a mão
Feitos de um titã Primordial.
Sendo a Lua Equidistante,
De Equinócio Colateral,
E o nosso Eclipse um vislumbre de mundos,
Numa passarela casual,
A luz só te alcança na duração de um sorriso,
E morre, leito obscuro celestial.

Tu, Cordeiro Cósmico,
És sacrifício residual de si,
E de um Deus do ócio,
Pois este Deus,
Ao contrário de Isaque,
Empurraria a faca até o fim.
Sangue e Cosmogonias.
Argonauta da inexistência em si.

E eu, pagão,
Sendo tentador, oblíquo e preciso,
Preocupado em ser farol profundo,
Não posso cair, abraçado, no teu precipício,
Serei o teu inverso Sacrifício,
Iluminando à sóis o mundo,
Sentindo o sangue quente na boca,
A maravilha de se estar vivo,
E te farei canções e elegias,
Para o teu post mortem Benefício.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Levante-se.
Retira esse véu umbrófilo,
Deixa eu ver este teu rosto arcano-celeste,
Lance luz sobre o mal em segredo,
Dissipe ilusōes, o vazio e o medo,
Tudo pode ser sombrio e campestre.

Não lamente - senão serei pranto também.
Esperando em Ítaca, em triz tece,
Não derrame mais lágrimas nem teu sangue,
Perpetue o rio da tua vida aqui,
Derrame teus fluidos acres em mim,
Eu, tua Ânfora Agreste.

Verta teu sangue em mim,
Chore o sal da terra no meu peito,
Dissolva com estrelas, emplastro cósmico insatisfeito,
Cicatrizando solidão, o óbvio e o degredo.

Reconheça em si a força absoluta,
O motor biocêntrico do teu corpo bizantino,
E a verdade absurda de se estar vivo
Ao escolher a vida como hino,
Utilizando artifício abstrato incerto.

Um poeta que canta liberdade não agrada aos mestres,
Caminho de pedra sem sentido,
No qual um deus que se ajoelha colhe frutos silvestres,
Veleja-se num barco branco, acende-se luzes graves em tese,
Ao encontrar Apoteose no Oeste.
Como convém a um deus e a um poeta.

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Monocœurdia.

Tantas noites enquadradas pelo tédio,
O eterno caminhar nas ruas em preto e branco,
A vida bonita mas Monocœurdia.
Até que tua luz me atingiu.

Não se fez dia nem sol,
Foi luz lunar, tímida, palatina,
Faca de prata cerimonial que chegou pelas frestas do destino,
Cortando luzes em acontecimentos
No Altar de astros.

Abraçados nas trevas líquidas,
Seguros por um fio cintilante-lazúli,
Uma Lanterna tensiona os motivos numa lâmina.
Mergulho nas estrelas.

A vida é acidente da matéria,
Mas pode-se faze-la em cores novas.
Há de se afogar o azul
E abraçar o breu.
Teus olhos.

O teu mistério me fascina e me preenche,
Teu rosto me lembra o que é estar vivo,
E a maravilha de ser conquistado, Granada, pela tua cavalaria selena ibérica.

Flor bérbere do Lácio-Cartágeno,
Que desabrocha o desconhecido,
Emissário cósmico,
Diana dos bosques atlânticos.
Te convido para dançar na floresta
Em acordes mouriscos e tambores de aurora.

Vem, que viver é perigoso.
Vem que as selvas argéntuas são nossa alcova,
Vem que os espelhos d'água vão legitimar nossa divindade,
Vem que meu desejo já produz novas estrelas e move os continentes.
Vem porque se vamos nos afogar,
Há de se afogar num só sonho.
Num só salto.
Num só precipício.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Biocentrism

Biocentrism

The spring breeze is quiet,
It sings through a blossom tree at the cemitery.
It whispers secrets and caress my lungs.
Its not like summer's rashness
With such volition to emancipate and destroy.

I'm not that young,
I can't be any more sunlight,
I shall become wind,
Murmuring old concepts of freedom,
Known to moutains and old rivers.

To shout is to waste gorge,
As scorched souls can't grasp yet
What was supposed to terraform a mind.
There is no fall,
The winter is ravenous,
It comes before leaves start turning yellow,
There is no midstream between vitality and demise.

"You are alive", I could try,
But there is no louder sound than life itself,
If one can't hear it's clasping roaring,
It'd be a profane attempt to wake the dead.

Leave them to die yet existing,
They'll someday feed the Tree.
Unconscious roaming souls who don't want to live just slumber,
And awake someday as carmesin flowers,
Hanging on vines of eternity.

Life always finds a way.
Let's pray for the undead flowers.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Ode a Kakaroto

Van Gogh, "Two Crabs", January 1889. Oil on canvas, 47 x 61 cm. Private collection, on loan to the National Gallery, London." via Van Gogh: The Life


Somos lágrimas de Estrelas.
Somos fruto de suas oscilações e incoerências,
Daquela vontade súbita que A Menina triste tem de desabar e chorar o mundo,
Pois ela, assim como as estrelas,
Não tem muros nem Fronteiras.

Por não ter fronteiras
Se permite misturar suas luzes com as do Universo,
Não bloqueia sombras, nem dores, nem frios,
A agonia a consome,
Pois sente a dor até da flor que morre na calçada,
Ou o Caramujo que morre no Apartamento,
E enquanto viver colecionará as farpas da vida - onde tudo dói - das Pedras aos Casulos.

A Menina-Estrela chora o Mundo,
Pois Ele já não tem lágrimas nem Sacerdotizas que o façam.

O mundo secou pelo pranto,
E a Menina gerou lumes de seu choro,
E foi mais ou menos assim que o Universo foi parido,
Da dor de alguém sem fronteiras
Que lacrimejou a matéria.

Desenhos visigóticos e primaveris são
Utilizados para preparar seus uguentos,
Pois as feridas são abertas como que por Inocência, e cutucadas pelo Tempo-Criança num balanço periódico.

We're so Fragile,
Me disse uma vez um escorpião - ainda que impetuoso e encouraçado.
Uns apontam-na logo: Fraqueza
Onde eu enxergo a Força de se carregar o mundo pelas Pálpebras.

E eu só lhe diria - Menina, arranque os cílios. O que você deve ao mundo?

Deus, abençoe minha Vó, pois ela não sabe o que faz.
Só tu, Sumidíssimo Pai, sabe quantos Universos se Efêmeram em cada Lágrima da minha Menina-Estrela.

Uns dizem que é Crônico.
Eu digo que é o próprio Tempo.
Quantos mundos, dores e lágrimas cabem num pranto?

O coração se aperta entre soluços de um choro que não é seu,
Se amontoam tristezas que não lhe pertencem.
Escravidão por não ter muros em seu EgoCastelo.

Menina, mande o Universo pastar matéria escura,
Me chame até vocalizar teus muros,
E convide teus amigos para jantar.

O Universo pode arranjar a sua dose de incoerência nas estrelas,
E arranjar olhos para chorar,
Pois ele sabe que algo está muito errado.
Nós também sabemos.
Mas somos efêmeros demais para nos importar.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Genghis Khan

Genghis Khan


Tenho saudades de quando eu era Deus.
Quando dormia aninhado sob suas barbas,
Longas, semíticas, latinas, ibéricas,
Entrelaçadas em fibra quase inquebrável,
Ponta e fio se confundindo entre Continentes,
Dá quase pra ver os povos e os vestígios de movimento.
Ali eu não conhecia os pecados do mundo,
E principalmente não conhecia os D´Ele.

Hoje durmo sem tenda,
Ao vento - Sereno.
A yurt branca de couro curtido
Não é mais esperança, vela, nem passagem.
É minha Muralha.

Durmo agora sobre o céu infinito,
Cavalgo com imperadores mongóis paralelo às estrelas,
E com o vento impiedoso me soprando
Ao me cantar solidão

                    - Faço com ele um dueto. O vento não sabe o que é solidão. Vem, Vento, que eu te ensino.

Achei que meus anos escorreriam,
Ampulheta inevitável de areia tão fina,
Deveria então aproveitá-los com eficiência hedonista máxima, claro,
Única forma válida de sobreviver.

Hoje, aprendi com uma Velha ao discordar dela
Que meu Capital vital se valoriza quando especulo-o pela paciência.
Quando sou Velho na rede na praia feito Caymmi.
Não se pode ser Príncipe Bórgia Ávido Tódo Témpo.

Tendo cavalos de menos e estepes demais,
As cavalgadas mortais devem portanto verter orgias e armistícios.
Pois os tempos bélicos ficaram no passado,
De mãos dadas com a e a ignorância.

Eu, sendo Jovem & Velho,
Só tenho tempo para os ventos calmos e as ondas serenas,
Para os deleites mais demorados - feito aquele beijo
Que parece que flerta com a eternidade...

O Grande Céu Azul é infinito.
E posso senti-lo me envolver, me abraçar, difuso,
Passando por mim e me consubstanciando.

                    - É desperdício ser pedra árida, insólita.

Quero ser brisa, calor e chuva,
Quero me transformar num dia bom.
Não tenho paciência para o manto dourado, alvo ou carmesim.
Não almejo Perfeição nem Flor Imperial,
Sou flor banal, daquelas que brota na pedra mesmo,
Mas teimosa por enradicalizar a liberdade.

E que tenho na cor um cheiro,
Na acústica um sabor,
Nas veredas um destino:
Deixar de ser Pedra e me fazer Rio.

Ser Cavalo é honraria e mérito,
Quem quiser que cavalgue em quem quiser,
Pois até Genghis Khan era Cavalo,
(E ninguém tinha nada a ver com isso.)

Eu sou aquele que joga armadura lustrada no chão,
Pois o Aço pertence à terra,
E eu já não convido lâminas nem flechas.
Meu peito foi feito pra levar vento,
Barco que ponteia meridianos,
Entropia Antropocêntrica de caminhos inconscientes.

                    - Tudo é Inércia

Já eu sou Apoteose Holística entoada,
Que reverbera pelas estepes.
Eu sou Horda de Luz-Aríete,
Destruindo todas as Sombras-Muralhas.
Eu sou a Liberdade à Cavalo,
Eu, Embaixo do céu - Sou.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Perpétua Ingratidão

Cadê você?
Somos iguais, em quê?
Escute eu te dizer,
Sou teu mais do que quero,
Posso, acho, sinto que deveria ser

Seja raiz de mim,
Seja raiz de mim,
Me faça brotar,
Como se eu fosse a flor
Da tua perpétua ingratidão.

Cadê você?
Somos iguais, em quê?
Escute eu te dizer,
Sou teu mais do que quero,
Posso, acho, sinto que deveria ser

Seja raiz de mim,
Seja raiz de mim,
Me faça brotar,
Como se eu fosse a flor
Da tua perpétua ingratidão.

Sou de você.
Sou teu, somente ateu,
Até não quereres enfim,
Revolta, volta, volta, volta a Serafim.

Seja real,
Pedaço por pedaço,
Construa em mim mosaico,
Arco, flecha, dor,
Teu olho que mirou em mim,
Sinto o tiro, em flor, enfim.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Óleo de Baleia

Óleo de Baleia

São os gritos entre as paredes que tecem a noite,
Construindo muralhas de medo com tijolos de
Dor, pesadelos, violência, sangue e silêncio.
Na casa não se escuta um pio.
Apenas a coruja pia, piando pianíssima na pia,
Em gotas.
Igual ao temor,
Que goteja traços do que se ignora à noite.
Luizinho, tão moço,
Perverteu-se no escuro.
Seus sonhos foram rasgados pelas trevas.
Hoje choramos no seu caixãozinho caiado.
As goiabas terão seu gosto doce.
Morreu à noite, no tear da nossa invigilância,
O penico é insuficiente para um menino curioso.
Maria foi raptada pelas sombras.
Moça tão boa.
O feijão dela tava ficando gostoso,
E agora as telhas velhas nessa dessa Casa terão o
Eco dos seus gritos, tão difíceis de esquecer.
Estão no céu, com Deus Nosso Senhor,
Luizinho e Maria.
A alma tem a mesma cor.
Nossa Senhora não sabe distinguir os cachos.
O Demônio está à solta,
Vaza pelas paredes desta casa, eu sei.
Escuto seus passos,
Posso senti-lo ofegante, cálido, ansioso.
Sente-se o cheiro de gesso e sangue entre suas unhas.
Dona Conceição quanto mais reza cruel fica,
Vive falando com os santos, mas parece
Que só o Diabo escuta.
Mulher ruim de olhar seco.
Toda vez que me chama "Oh, Zabelê!" Me gelo toda.
Faço de tudo para não dar de cara com ela nos corredores.
Já Seu Guimarães é quem me procura...
Tenho mais medo dele do que o Satanás que percorre essas paredes.
Minha rede já tem o cheiro dele e de agonia.
Só de pensar engulho..
As garras do monstro emparedado devem parecer renda comparada as Dele.
Dona Clarinha era quem eu amava. Moça tão linda.
20 anos que converso com ela em cartas de banzo.
Parece que o Lume da Casa apagou.
Uns dizem que ela foi pra Europa.
Eu queria acreditar, mas eu sei o que teve de verdade,
Não consigo mais fingir não saber.
O seu destino até hoje me dói.
Vida de moça negra parece cama de espinho, num é?
E as rosas alvas é que bebem essa nossa Sangria rançosa.
A Sangria de Zélia também, a tantos anos,
A sopa dela parece um sarapatel de galinha velha.
A coitada ficou louca,
Parece que virou mãe depois de velha.
Fica conversando sozinha de noite.
Todo mundo tá morrendo.
Desde que o caboclo Zilmar foi pro tronco,
E depois pro Formigueiro,
Seu Guimarães e Sinhá Conceição não tiveram pena.
Sua filha com um Caboclo? Era melhor morrer numa tocaia.
Essa casa não teve mais paz.
Demorou 3 dias pra Jesus ter pena e levá-lo.
Clarinha já foi-se embora logo depois.
Dá até pra sentir o Demônio fungando aqui.
As sombras das velas dançam até desenhar uma cruz no teto.
Me lembram que toda luz traz dor.
E que todo mundo é um pouco Jesus nisso.
Tanta saudade de Clarinha.
Tá todo mundo morrendo.
Deus tá castigando a ruindade do homem.
O que é isso? Que barulho é esse? Saia daí, eu sei onde você tá.
Saia da parede.
Quem é você? Seu Guimarães também? Sinhá?
Clarinha pariu entre as paredes... Meu Deus, tenha piedade.
Úteros e Vasculhantes não fazem parte do teu domínio, Oh Senhor.
Zélia te deu o leite junto com o sangue. Tua Ama sangrenta.
Feijão, Gesso e Vingança de desjejum.
Por favor, tenha piedade, eu não mereço morrer.
Eu juro que eu não conto pra ninguém, me deixa fugir dessa casa assombrada.
Eu não tenho culpa, eu juro.
Não se pode vingar de tudo, senão o mundo era uma facada só.
Deus também é Misericórdia. Num é não?
O Diabo então é Misericórdia.
Rogai por nós que recorremos a vós.
Pelo Sinal da Santa Cruz.
O gesso daqui parece que é demoníaco mesmo.
Argamassa de funerais.
Óleo de Baleia, para ungir.
Que vem de Navio Negreiro.
Viver é temperar uma Cabidela sem nunca mudar o gosto do mundo.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Cobalto




Eu te vi.
Te encontrei na esquina do que desconheço.
Teus olhos exceleciavam nas sombras.
Sempre soube que a escuridão era mais elegante.

Cobalto encostado no muro,
Escafandriavam meu existir submarino,
Com melancolia das eras eles me varriam,
Me penetrando, rasgando irremediavelmente o que em mim ainda sonhava.

Sem nem saber se existes,
Te encontrei nas minhas esquinas.
E agora me fazes tanta falta que me ridículo.

Me apareça.
Que eu abdico do abismo do que sei,
E deixo teus olhos me encontrarem na luz do incerto.
Só tenho fé na luz dos teus olhos.

Tanatos é neto de Afrodite,
E eu morro um pouco toda vez que Morfeu te traz,
Posto que tu és sal de Eurídice,
Estátua de Sodoma & Gomorra,
E eu desaprendi a cantar quando mergulhei no teu azul,
E aprendi a nunca mais olhar pra trás.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

O livro na parede me mira,
Me faz anátema-malefício,
Maldição dos meses que vivi,
Ao teu lado sendo feliz-suplico.

Infecta todas as memórias felizes,
Feito chorume em Rio-nascente,
As palavras manifestas, atrizes,
Se balançam aéreas-luzentes.

Dorian canta Ossanha,
Em seu retrato cálido posto,
E no livro Ogum metafísico,
As flores de ametista brotaram,
E morreram secas no armistício.

O ciclo cansa e exaure,
Encontrar afeto em outros cachos é lei,
Voltar depois de queimar os barcos não pode,
Guerreiro leal de mim o Rei,
Não se volta depois do cheiro do carvalho-orvalho aceso,
Quando os souvenirs tem cheiro de Dei.

Me ungi com o óleo das páginas,
A primeira púrpura rasgada dei,
Como títere de planos e vontades,
Saber cortas cordas quando precisei.

A dor pertence ao mundo,
Da virgem amar o escorpião,
Enquanto este ama violar o que é casto,
Posto que o que é Libra só dura este momento,
E a desbalança se põe em ação,
Depois é opressão do corpo e só,
Corpo-são mente então.

Vou deixar o livro lá, me olhando,
Será a lembrança da crueldade material,
Como troféu de cabeças na sala,
O escorpião vencido e carbonizado,
Veneno expiado de quem atravessou o rio-monge à nado,
Enquanto penetrava-se pelo aquiescer,
De quem precisava se sentir vivo-alado,
E toma doses de veneno todo amanhecer.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Fogueira de Campina

Teu cheiro ficou em mim,
Na camisa de botão,
Na noite de São João.
Nosso amor foi a fogueira do Sertão,
Brasa e cinza.

Teu beijo ainda queima em mim,
Na colcha de algodão,
Na noite da Solidão.
Nosso amor já era a fogueira da Ilusão.
Fumaça e luz.

Teu gosto ainda amarga em mim,
Nas sombras do São João,
No adeus no teu portão,
O nosso amor era a fogueira de Campina
De plástico.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Le Pierrot en blanc et noir Veux la vie comme un ancien film, Il parle, mais pas de mots sortir, parce que sa vie est muet et triste Et ta bouche, ta sourire est brute, La bouche se sa scellée Mais les lacrimas son tout Les coulers du Monet.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Texto trazido do Timeline do Face.

Essa é a última vez que vou me pronunciar sobre o 2° Turno. Todo mundo já sabe o que tem que saber, é um saco ficar repetindo a mesma coisa o tempo inteiro. Claro, vou compartilhar algumas coisinhas, afinal o que seria da minha timeline né? kkkkkkkk.

Mas enfim, eu cheguei a uma triste conclusão sobre as escolhas dos candidatos - quanto ao nível intelectual dos eleitores. Há pessoas inteligentíssimas e burras-como-uma-porta dos dois lados. Conheço verdadeiros gênios petistas, e verdadeiras mulas psdbistas, e o inverso também. A crítica vai para os dois lados, mas sim, principalmente dirigida aos petistas.

> Constatei uma coisa que me preocupa: quase ninguém entende absolutamente nada de economia. E quando acha que entende é pior, pois se fecha para novas informações. Absolutamente NENHUM petista sabe ou se interessa por economia. Conheci uma pessoa até hoje com o cabedal de conhecimento impressionante que vota em Dilma, mas mesmo assim não sabia explicar porque apoiava a macroeconomia politica do PT, pois era indefensável até para ela. Era pura teimosia ideológica, pelo menos nessa questão.

Alguém que vai votar em Dilma quase sempre ignora completamente os dados econômicos na história recente, ou falha completamente quando tenta explicar a macro-política econômica do governo que apoia. Dispara apenas "PT luta pelos pobres, PSDB pras elites!". Repete um discurso velho, velho, cansado, dizendo que o PSDB é neoliberal (hahaha). Cansado demais de ouvir isso. Seria um prazer ouvir um petista me falar com graça sobre economia. Até hoje só encontrei diplomatas vendidos como Celso Amorim, keynesiano raso, político-raposa.

Isso aqui não é uma ofensa dirigida aos petistas. É infelizmente o que pude constatar nesse tempo. A maior parte tem muito interesse em fazer o certo, em combater a pobreza, lutar pela igualdade. Mas falam abertamente que não se interessam por economia. Ora, essa posição é como uma competição de esgrima onde não se quer pegar na espada. Desde quando política conhecimento econômico andam separados?

É uma tristeza conhecer tanta gente absolutamente brilhante, mestres em tantas áreas, mas que não fazem um mínimo de esforço para tentar entender o contexto político em que vivem, na sua raiz mais pragmática - o dinheiro. Entendem TUDO de história, política, golpes, ideologia, força, relações de trabalho, opressão e guerras, mas ignoram a malha econômica que sempre esteve por trás de tudo, achando que sua definição retirada dos livros de ensino médio sobre imperialismo romano-inglês-americano são o suficientes. Ou que a Carta Capital ou Sakamoto, ou a Veja e Rodrigo Constantino são o suficientes.

Toda e qualquer política precisa ser financiada. O funcionamento do país é abastecido, alimentado pelo dinheiro. O que eu constatei foi que até nos mais altos graus da academia, até os professores que eu mais admiro, falham ao analisar e expressar ideias simples como o tripé econômico. Quantas pessoas sabem explicar o que é, qual a importância?

A realidade é que a grande massa ignora esses fatores CRUCIAIS, e não só a grande massa, mas a elite intelectual, inclusive as pessoas mais inteligentes que conheço têm preguiça pura de entender o que move a nação, e de entender que isso é chave fundamental do processo democrático. Não há política social que se sustente por muito tempo sem um aparato financeiro que o alimente. Negar esse fato é infantilidade, ignorância, desonestidade intelectual, demagogia, visível imoralidade, ou qualquer coisa que o valha. Não que eu seja um economista, muitoooo longe disso, sou estudante de Direito, sou medíocre até no meu curso, quanto mais no dos outros.

Sou apenas curioso. Mas essa é a única diferença - a inquietação. Nunca a inteligência. Quando alguém vem e repete uma coisa que leu ou na Carta Capital ou na Veja, essa pessoa realmente entende o que aquilo diz? 95% acha que sabe o que é inflação, quando eu só conheci 3 pessoas até hoje que sabiam me explicar com propriedade. Uma lástima. Todos confundem carestia com inflação. Esse é só um exemplo de inúmeros dados, institutos, comparações e análises históricas falaciosas, imprecisas, baseadas na opinião-geral infundada. Quantas fontes opostas ideologicamente para comparar panoramas aquela pessoa procurou? Quantos livros leu ou quantas palestras de economistas (americanos, europeus, principalmente) assistiu?

O maior problema do país, pra mim, continua sendo a ignorância. Mas não aquela ignorância que salta aos olhos, do analfabetismo. Aquela que anda junto da pobreza ou do fanatismo. Mas sim aquela velada, aquela que é motivada não pela impossibilidade material de se estudar, ou pela falta de habilidade intelectual, ou mesmo pela base defeituosa, mas pela pura PREGUIÇA.

Esclarecendo, não estou defendendo aqui que o PSDB tem um plano econômico EXCELENTE. Mentira, é uma coisa básica, mas que funciona em todo país do mundo. Quando o PT parou de aplicá-la no final do segundo mandato de Lula o país começou a frear o crescimento. Ou seja, diminuir o ritmo na luta contra a pobreza, em outras palavras.

Vejam, isso não é uma defesa aos ideais liberais. Não aqui, não agora. Até para os programas sociais de distribuição de renda é necessário o crescimento econômico. Não é preciso ser capitalista para entender de economia (mas parece que o inverso se faz inevitável pela práxis), nem socialista para querer enfrentar a pobreza ou as relações de exploração. É questão de conhecimento e pragmatismo, seja pela visão de qualquer corrente.

É necessário sim o fim dessa linguagem hermética, posto que os resultados nos afetam grande e diretamente. A popularização desses estudos é essencial ao desenvolvimento do ideário e da nação. É importante conhecer inúmeras vertentes político-ideológicas antes de se adotar uma ideia. Conhecer o outro lado do espelho nos permite o auto-conhecimento.

Precisamos URGENTEMENTE de uma educação financeira concreta nesse país, nas escolas, nas universidades. É inadmissível viver num sistema democrático sem exercer com firmeza e sabedoria o republicanismo. Mastigar dados de forma ruminante, sem conseguir processá-los direito, e se juntar ao turbilhão titânico do fluxo acéfalo de informações falsas, mal pensadas, irrefletidas, e demagogas nas redes sociais é uma caminhada lenta e certa para o abismo.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Herança

Cinzas, formol e mortalha. Deixo a vocês, ilustres desconhecidos, a única coisa que verdadeiramente possuía. Deixo minhas veias, por onde antes o sangue fluiu, quente, me aquecendo contra as noites frias, e que corria mais rápido quando eu via o meu amor. Deixo o meu pulso parado, as artérias coaguladas e o sangue seco. Deixo minha pele, meu couro curtido pelo tempo e pelo sol. Os meus ossos, que sustentaram minhas carreiras na infância. Deixo meus olhos, agora apagados, mas que um dia brilharam de medo, êxtase e dor. Deixo minha massa cinzenta, ex-maestra de um caminho estranho. Os meus músculos, que por sua vez potenciaram movimento; movimento é vida. Minhas vísceras, apesar de não saber o que vocês farão com elas. Meu pulmão, tão pouco usado, posto que podia ter fumado muito mais. Adorava fumar. Minhas mãos, e tudo que as envolve, as quais seguraram tanta coisa, até mesmo outras mãos. Minha garganta, avenida por onde tantos sambas passaram.

Vocês, desconhecidos, de certa forma podem ser considerados parasitas. Mas sem ressentimentos. Vocês usarão o que tive de melhor, e lhes deixo de - herança. Nobreza da intelectualidade, guardiões da biologia, sacerdotes da cura institucionalizada. Artesões da vida, alquimistas, que transformam o que não poderia ser em vida. Por isso, minha devoção e agrado.

Usem-me bem. Quando me olharem de novo, deitado sobre o metal frio, lembrem-se que ali eu vivi, e meu corpo conta a história, como hieróglifos inscritos em organelas. Cantei, dancei, amei, sofri, e sou o retrato do vosso futuro irremediável. Portanto, tracem o caminho do bisturi e dos dentes com a maior precisão e solenidade, pois até os vermes e os estudantes me devem gratidão.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Dialética dos Metais



Me disseram:
"Seja mais pragmático. Ideais não botam comida no prato."
Certo você.

Por isso mesmo se trabalha,
Até porque o escambo do suor permite o frio barato do ar-condicionado.

Por isso eu quero comprar,
Pois Eu não estou à venda,
Minhas ideias não foram feitas para serem anuladas,
Dobradas pela força-ventania da vida,
Meu destino serve pra outra coisa.
Serve para se impor apesar de.

"A realidade se impõe como um martelo",
Ainda bem, não esperava outra coisa.
Pois sou feito do aço mais antigo,
Vim da terra, rasgando-a pelas eras,
Forjado na pressão e no calor,
Caminhando para o sol,
Separado de minhas impurezas originais.
Sou anvil-fortaleza.

Sou Bi-Gorna, esperando pela opressão do mundo.
O que faço é afiar outras lâminas que passam por mim,
Em brasa, pela dialética metálica,
Filtrando a pureza do ferro bruto, obscuro,
Para no fim brilharem na noite as fagulhas do que é certo,
E por um instante iluminar o mundo.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014





Peguei!
A estrada. Pela primeira vez, sozinho. Isso é ficar velho. Guiava o volante a 160km/h. Banal, eu sei. Mas se houvesse qualquer deslize, qualquer desatenção, poderia ser o meu fim e o de outros. A morte sempre está perto do fim do velocímetro.

Vim, apaixonado, claro. O dia estava lindo. O sol batendo no asfalto, nos lagos e baixios, e o horizonte era pintado por mata atlântica e as colinas sem cana se espalhavam pela vista. Era até fácil e gostoso observar a gradação do litoral ao agreste. Os vários tons do pincel da seca no pasto. A música também não deixava a desejar. Cd´s antigos de meus pais, cada um com uma matiz diferente de memória.

Um amigo me ligou chorando dizendo que sonhou com minha morte, o corpo perdido na BR por 2 dias, e a sua angústia de não ter atendido meu funeral. Não sabia se era sonho ou realidade quando acordou. Bem, só me sobram duas coisas a dizer:

- Que posso fazer? Sou pontual até pra morrer e ser enterrado.
- Ninguém realmente sabe se está sonhando ou se está acordado. Deal with it.

E por mais bonitinho que tenha sido saber que alguém sentiria minha falta assim, o agouro me deixou inquieto. Viajei todo fatalista e saudoso da própria vida. Me despedindo do meu amor e da minha mãe, numa gravação residual de vida, na martelada do fogo, da gasolina e das ferragens que me perfuravam os orgãos. Ai, meu rim esquerdo. Hum, que gosto de ferrugem. Eita, outro redutor. Freia, buceta.

Enfim, venci a morte. Pelo menos por hoje. Pelo menos enquanto escrevo isso. Mas tudo isso vale a pena demais. Só pra sentir de novo o calor Dele. A gente não serve pra morrer. A gente serve para transformar fotossíntese e glicose em afeto. A gente serve para amar, e ama para servir.


















Novas Azuis




Procuro alcançar a elegância das estrelas,
Lançando luz no tecido noturno,
Entalhando feixes de milênio,
Percorrendo o caminho do infinito,
Que esbarra na retina em um grito.

Procuro alcançar a altura das estrelas,
Fazendo o caminho inverso do firmamento,
Tocando o chão com as mãos,
Achando galáxias no cimento.

Procuro enfim emitir suas luzes,
Espectros infinitos de belezas crômicas,
Nuvens de carmim, poeira cósmica e som,
Novas azuis com novos tons.

Eu sou filho das estrelas,
De suas incongruências íntimas,
Da sua incapacidade de ser infinita,
Eu sou a incoerência de se fazer apenas lume sem sombra.
Eu sou o amor da cabeça aos pés.
Engraçado como as coisas mudam. Eu nunca começaria uma com uma frase de efeito e tão clichê. Mas as coisas mudam. Tudo tem fluxo. Nós fomos feito dois rios que se cruzaram, misturaram seus fluidos e afluentes e por fim tomamos caminhos diferentes de novo. A solidão será nossa última foz. Tuas águas estão em mim. Teus fragmentos ainda refratam e rasgam dentro de mim. Espero que os meus o façam em ti também. Questão de equidade e vendeta. Minhas águas eram claras e cristalinas, pragmáticas. A linguagem era solta e germânica. Corriam retas, sem muitas curvas, devagar e sempre. Mentira, eram águas caudalosas e cálidas. A serenidade te pertencia. Eu nunca abri muito espaço para ambiguidades. Mas sempre houve espaço para flores e caramanchões na beira do meu rio. Meus desejos e intenções eram desvelados, quase palpáveis de tão verdadeiro quando consubstanciados no ar pela fala. Eu queria você. Queria misturar minhas águas nas tuas até o fim, até nos salinizar no pranto de nossas conquistas em Delta. E queria te cristalinizar. Achei que era algo como uma missão. Devaneios satúrnicos. As tuas eram quase negras, mas eram mais obscuras. Eram ciganas, oblíquas. Dissimuladas. Tu eras um rio tortuoso. Com mais segredos escondidos sob as tuas águas que o São Francisco. O teu rio era feminino, lunar. Eu era tão solar que não vi teu brilho delicado. Enquanto o meu explodia de beleza no Alvorecer alvoroçado, o teu, paciente, escondia a beleza do mundo por debaixo das pétalas da Lua. Cada camada de luz aberta revelava um encantamento novo. Me ensinasse o significado da Serenidade. Eu a aprendi nas noites de glória em que dividi tua alcova. Eu, tão dominador, tinha sido completamente catequizado pelo teu paganismo ateu. A verdade é que éramos veredas. E o que nos alimenta ainda é apenas o leito rochoso de minhas memórias. Poderiamos ter matado a sede do mundo, da civilização ocidental ou da América do sul. Fertilizado os campos com nossas águas. Mas secamos antes. Exatamente por isso. Pra você, civilização ocidental é uma invenção, e acha que os beduínos são civilizados e os parisienses não. Água, pra você não merece ser gasta nas plantações de soja. Apenas permacultura orgânica indígena quilombola. Você falou em Fa bemol eu respondi em Mi sustenido. Eu fui aristotélico, você negou minha dialética atraves de Frunkfurt. Pra você, Platão não é filósofo, mas Judith Butler sim. Você não sabe quem é Ayn Rand, Milton Friedman, nem.Hermann Hesse. Eu não sei nem quem você lê, pois você não me fala. Eu acredito no mercado, você acredita no novo amorfo. Eu gritei - justiça, felicidade, progresso Você gritou - não me representa. Como viver e construir uma vida quando não falamos a mesma língua, quando não compartilhamos nenhum valor, quando a única coisa que nos aproxima é um capricho da natureza de nos amarmos? Você foi minha mais amarga liberdade, e eu fui tua mais doce prisão. Já que a vida nos separou em Veredas, deixa eu ser pelo menos o teu passarinho que te visita quando a saudade aperta. Quero ser teu Manoelzinho-da-croa. E eu vou cantar para ti, já que o canto dos pássaros não possuem fronteiras. A gente vai se entender pela beleza.

Biombo





A língua que os deuses falam é a própria beleza. Sem o encantamento que nos impacta são absolutamente incomunicáveis. Nem seus atos se substanciam, pois há um véu que separa nossas existências. É a beleza, bordada em mandala oriental no tecido da existência, que se pode entrever por esse biombo.


A Dor de Se Fazer Mulher





Não, não venha não me dizer o que é o amor,
Só você que sente a dor de se fazer mulher,
A mão, o cio o fio, a terra encosta na primavera.
Os uivos da solidão não encostam não,
Eu te encontrei.

Me diz quem é você, tanto poder num olhar,
Me diz, irmão, irmã, tenra manhã para se ver brotar,
Em flor, em cor, em dor, se não é o amor é temor.

Sei que eu não sei,
Teu destino é raro,
O meu é fardo te ver passar.

Aurora desponta agora,
E me retorna o olhar,
Te cuido, solto no escuro,
Rompo meus muros para te consagrar.

Eu sou teu, teu olho é meu,
Na escuridão, brilha o que não se pode negar.

Me diz quem é você, tanto poder num olhar.
Me diz, irmão, irmã, tenra manhã para se ver brotar,
Em flor, em cor, em dor, se não é o amor,
É temor-de-ficar.

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Tu eras luz e precipício,
Minha tinta e voz de todo grito,
Hoje é dor, morte e o infinito,
Teu olhar agora é a faca que ponteio.

O tempo só amola,
Afiada, como a memória,
Me cortou, inglória,
De quem ignorava quem primeiro.

Os fogos na praia coloriam o breu,
Teu olhar, difuso, ofuscava o meu.
Eu me esquecia de me ser,
Apenas te era.
Eu era breu.

Eu sequei, meu sangue coagulou,
Encrusta minhas pálpebras rasas,
Escalona a agonia, maresia, ferro,
Em tudo que falta vai sangue no lugar,
A lágrima, púrpura, escorre,
Fico feliz se meu sangue escorre,
Enquanto o teu punhal enfeita.

Teus olhos, cândido algoz,
Terá a cor régia do que me vivia.
E teus olhos então serão,
Minha tumba e companhia.

Temos aqui um Poema de valores arbitrariamente impostos pelo autor. Narra uma historinha de amor obscura. De forma tosca. Siga as luzes. Boa Leitura. Ass Lord Bumbum-Mole da Silva.





Eu                       Levantei. Mas no meio disso estava
    Caí, depois me                                                      "OsufnoC".

   ,poucos aos melhorar Procurei

       Me aprumei, enfim.

 
E então ELE voltou. De novo.

E então EU não tive Piedade.

E fui deliciosamente impiedoso.

E me libertei enfim das garras da minha própria fraqueza. E descansei.

Pedro Anátema

Um olhar, um aperto,
Daqueles que duram muito,
O mar, a onda,
Autofagia de língua.

Extremos debaixo da pele,
Choque térmico de contornos,
Estômago seco,
Coração impune,
Helicóptero de vendavais.

Vidro severíssimo,
Paga luz na mesma moeda,
Talvez seja assim no mundo,
Reflexos de teimosia em
que a luz demora a chegar.

E assim nasceu o karma,
A vingança dos esquecidos,
Pois o Universo curva toda luz.

E o equilíbrio é o metal polido,
Foco imperfeito de luz,
Tolerância de Rouland,
Vendetas mais que tribais.

Eu tenho mágoas, quem não tem?
Mas em mim a sombra não toca,
Pois ela é filha da luz,
E toda luz que não vem dos olhos,\
Me dá medo e me suprime.

A palavra parou de me devorar,
Talvez não a ache mais nas entranhas,
Anagramas de mim,
Anátema de você,
Quando eu ainda falava na 2° pessoa,
Metalinguagem que me salva.

A língua é como o corpo,
Mas sem templo, ateia,
Crê no que diz, enquanto dorme,
Um beijo entre Platão e Nietzsche,
Alemães e gregos são irmãos,
Mesmo sem o Euro,
Sonambulismo fraternal.

E o poema é cama,
Não uma alcova,
Leito leite de mãe,
Ócio, sono, afeto,
Chupar o próprio dedo,
E dormir na eternidade.

Eita

É a vaidade dos tolos,
Encaixar o desejo na realidade,
Nulla et realité,
Foi franlatiniano,
Ou bad memory?

O meu limite é até onde vai o papel,
Até onde vai a sua paciência e bom gosto?
Botomless? Poliglota?
E se eu falasse um haikai?
Poesia. Absurdo. Pernambuco.
Flor. Raiz. Anátema.
Dicionário. Gregos. África.
Eles já sabiam de tudo,
A história foi decaimento.
Adoro essa palavra,
Litera-almente.
Concretismo?
Metalinguagem?

Por favor, não me usem
na aula de Literatura,
Viverei se for necessário.
Só pra saber se P. N. tava certo.
Porra Nenhuma.

terça-feira, 22 de julho de 2014

A Flor da Liberdade



Certas flores, ao lutar contra os influxos do destino, se fazem cheias de sumo concentrado. As secas e as devastações as tornam mais belas e luminosas. Algumas flores no sertão, em plena seca de mundo, se revelam verdadeiros espelhos do São Francisco. Oásis da existência, fortaleza da vida. Trazem na refração um prisma de beleza de cores, vibrações e potência. A guerra do caminho da seiva a (re)constrói de dentro em arquiteturas únicas. Suas almas são terraformadas pelo destino.

Eu conheci uma dessas flores.

Por mais que tivesse raízes, era absolutamente livre. Cavalgava nos campos no compasso quaternário de suas vontades absolutas. Sincopada com a própria vida. Era amálgama de cores e movimento que eram imitados pela vida. Não era mais nem flor. Era floração? Era brisa - Era mais. Pétalas furta-cor ao vento, se movimentavam e enchiam a terra de luz, brilho e esperança. Andava pelos brejos e desertos que verdejavam de novo por um ato ou olhar seu. Soprava um beijo e o Ipê floria em cores inéditas. Fazia das veredas lamacentas verdadeiros mananciais que corriam sorrindo e brincando. Trazia vida, música, cor, luz e misericórdia.

A flor da liberdade ao romper seus grilhões rompeu os meus, e me deu um beijo que durou a eternidade. Eu durei a eternidade. Meu coração se encheu de êxtase e calmaria, e eu nem era mais homem. Eu nem sabia o que eu era. Eu era cor luz movimento exaltação amor sorriso. Eu era um Deus.










terça-feira, 1 de abril de 2014

Um Títere e Suas Cordas



É muito fácil atacar sem restrições um Regime que torturou e matou. Difícil é entender seu contexto e suas alternativas históricas. Para esse e qualquer outro debate sério, não está apto quem discute inflamada e apaixonadamente sobre um assunto sem usar de logicidade e congruência. Esse é um dos temas da nossa história que mais promove discursos exaltados e uníssonos sobre o Mal da Ditadura, e como um pequeno e sórdido grupo de homens pequenos mas poderosos arruinaram o país.

Não, não é assim. Difícil mesmo é analisar o sistema com o olhar analítico necessário e fazer os apontamentos precisos.

Apontar por exemplo que uma parte expressiva da população era a favor da intervenção militar na época. Foram a favor DESSAS reformas implantadas por Castelo Branco.

Nesse momento, num contexto de Guerra Fria, onde o país se encontrava em cima do muro entre o imperialismo dos EUA e o imperialismo da URSS, onde o mundo corria o risco de uma guerra nuclear, e o medo era palpável, os militares representaram os anseios de uma parte da população que rejeitava o comunismo. Essa foi a parte que venceu. Poderia ter sido diferente, como o foi em outros países.

A ditadura nessa época era mais branda. Não sei o quanto mais branda. Não sei se houve mais prisões, menos torturas. Não sei. Só sei que a mesma população que aplaudiu o 1° de Abril de 1964 foi a mesma que lamentou o AI-5 de 1968.

Como toda e qualquer revolução/golpe/algo próximo, depois de um tempo, os moderados se veem encurralados pela ala mais radical, sempre mais disposta, fanática e pronta para acusar os moderados de súbita covardia. Isso aconteceu na revolução inglesa, francesa, russa, na primavera árabe. e em quase toda grande ruptura de um modelo.

A própria morte de Castelo Branco, (4 meses, depois numa colisão entre aeronaves? pff) soa um pouco como teoria da conspiração. Queima de arquivo? Disputas internas? Vai saber.

Tudo o que eu disse acima foi escrito sem colocar meu julgamento pessoal. Tentei ser mais analítico e distante. Aqui vai a minha parte que, pisando em ovos por ser um assunto muito delicado, tentarei escrever com o intuito de tentar mitigar a demonização da Ditadura, a qual sabemos que foi um período negro no país, mas que achamos, por algum motivo, que foi o triunfo supremo e absoluto do mal, no qual os pobres heróis nacionais foram perseguidos, amordaçados, presos, torturados e mortos por pessoas que praticavam o mal por serem pessoas más. Tanto a polícia, quanto o exército, quanto os oficiais, eram pessoas genuinamente malévolas. Essa é a ideia que temos, e que é comum de se ver propagada.

Tento aqui, analogamente à Hannah Arendt, judia, quando dissecou o holocausto, explicar em parte porquê aconteceu isso, os responsáveis, e como devemos fazer para evitarmos no futuro.

- Primeiro, quanto ao VÍDEO.

Por mais emocionante que seja a música, o confronto, um grupo de jovens coesos unidos militando por uma causa justa, acho importantíssimo analisar com frias lentes o que se passa.
O Professor deve ter tido algum motivo para apoiar o regime, não? Era ele um manipulado? Um idiota? Um imbecil, um cruel, um bruto? Não sei, não deu pra descobrir, não pude ouvi-lo. Nunca saberemos. Essa é outra forma de censura. O grito. O alto-falante. Só pude ouvir que os regimes comunistas eram sanguinários (correto) e que ele foi à favor do golpe. O porquê eu não pude ouvir. Grato, estudantes da USP. Se ele tivesse errado, vcs teriam ainda mais solo para se legitimar.

- Os apoiadores do regime o apoiaram do começo ao fim?
Não. Quanto mais tempo se passou, mais o regime ficou impopular e ilegítimo. Apenas as alas mais conservadoras o defenderam até o fim.

- O golpe foi fruto da política externa americana?
Não. Claro que o golpe foi apoiado, ideológica e politicamente, mas não precisou de interferência externa americana. Havia barcos americanos na costa brasileira? Sim, "Desarmados, à 4 dias de viagem para evacuar cidadãos americanos no Rio de Janeiro caso estourasse uma guerra civil como se esperava na época", de acordo com o embaixador americano na época Lincoln Gordon. Nenhuma gota de sangue foi derramada naquele momento. Esteve próxima de acontecer algumas vezes.

Havia interferência e interesse tanto dos EUA quanto da URSS, mas por questões geográficas inclusive, os EUA se deram melhor. Ainda bem.

- Os socialistas, a esquerda, os comunistas enfim, lutavam pela reforma democrática do país?
Alguns sim, claro. Mas a faceta mais radical, ligada politicamente à Moscou, a que pegou em armas, sequestrou pessoas, etc... Essas pessoas não lutavam pela democracia. Lutaram, primeiramente, para sobreviver, pois o PCB foi fechado entre outros partidos, e todo agrupamento, ideia, ação ligada (ou que se pensava ligada) ao comunismo foi perseguido.

Mas quero aqui ressaltar que no momento pré-golpe, forças da foice e do martelo estavam se articulando e pensando num golpe. Armado, sim. Ligas camponesas, sindicatos, etc. Porque haveria de ser muito diferente do que houve em outros países?

- Quanto ao pensamento comunista

A desigualdade naquela época era gritante, os trabalhadores não tinham direitos, e a saída que as pessoas naquela época viam era a revolução do proletário. Erraram. Tsc. tsc. tsc. Erraram feio. Esse erro cognitivo causou a morte de inúmeras pessoas e foi grande responsável pelo clima de terror e perseguição na época. Hoje sabemos o que aconteceu nos regimes comunistas. Não se deve julgar o pensamento daquela época pelas lentes de hoje. Mas me permito fazer isso porque muita gente ainda concorda com essas ideias. Múmias ideológicas que assombram a nossa capacidade cognitiva surgem do nada, fazendo a egípcia e com o rosto de perfil pra esquerda, pintadas nas pirâmides da desigualdade intrínsecas ao homem.

"Mimimimi o comunismo perfeito e infalível que habita minha cabeça nunca aconteceu realmente."

E adivinha? Nunca vai acontecer. Ele é uma fábula. E uma fábula cruel, podre da raiz, fétido em seu código moral, e desvirtua e corrompe a luta das pessoas simples por uma vida melhor transformando em morte, fome, miséria, prisão e escravidão o que antes era a busca por dignidade, com o estandarte da moral máxima da igualdade idílica. Desculpe desapontá-los, as pessoas não são iguais nem merecem as mesmas coisas. Não existe nenhum títere no céu, ou passível de ser substituído pelo Estado-mãe, que possa cortar, montar, modelar e repintar as marionetes que são os indivíduos. Se tentarem fazer isso, os fios se partem irremediavelmente. E tudo deságua no mais absoluto caos, como a história nos mostra repetidas e inúmeras vezes.

A vida de cada homem depende apenas dele, e somente dele, para guia-la e buscar sua própria felicidade. Ao Estado, cabe apenas garantir uma dignidade mínima e a segurança necessária para a luta diária do homem, pois Homo homini Lupus. Estamos aqui, vivos, não estamos? Até onde eu sei, não correm rios de leite e mel na terra, nem caem empadas e pastéis do céu. Ou seja, o trabalho é necessário para manter a vida. De que modo ele vai ser feito e seus frutos repartidos é um momento de uma outra discussão. Adianto que não acredito que o Estado saiba a maneira ideal de se repartir seus espólios.

- Qual era o objetivo do governo militar? Fazer o mal porque o sadismo reina?

A menos que eu tenha deixado passar em branco a matéria sobre o pacto N° 54 à Meneghell, eu acho que como tudo no mundo, os idiotas munidos de boas intenções e fervor no que acreditam são capazes de cometer qualquer atrocidade. Obedecer uma ordem de tortura, expedi-la, ou fuzilar mulheres e crianças num paredão. Opa, isso não aconteceu aqui. Foi em outro lugar onde os comunistas foram vitoriosos.

Como Arendt disse sobre os oficiais nazistas, eles não eram conscientemente culpados, eles obedeciam o regime legal vigente e eram operários burocratas que desempenhavam suas funções da maneira imparcial. Acredito que da mesma forma foi aqui no país. Tirando os requintes de crueldade nas torturas, óbvio.

Ordens eram expedidas, ordens eram obedecidas. Ou você era a vítima.
Quero aqui ressaltar que o mesmo aconteceu nos regimes comunistas mundo afora. E em outros que não eram comunistas.

Mas queria lembrar que não foi o momento mais negro da nossa história, talvez por ser mais próxima. As pessoas às vezes esquecem isso e aplicam uma lupa sobre o mal causado naquela época. Não preciso citar outros momentos, qualquer conhecimento básico de história responde essa pergunta. Lembrar é resistir. Lembrar inclusive do que aconteceu antes.

- Conclusão?

Quero, portanto, ressaltar que quando qualquer Governo, o monopólio da força, é utilizado, mesmo que com o melhor dos intuitos originais, garantir interesses de um grupo, para cercear a liberdade de pensamento, de produção e de consumo; passando por cima de um Estado democrático de Direito legítimo. Quando o governo é usado dessa forma, sangue, escravização, prisões e mortes serão os resultados inescapáveis dessas ações.

A força, a violência, quando não usada para a defesa legítima e justa, será sempre maléfica, irremediavelmente corrupta e prejudicial. A violência é o contrário da Vida e da Razão.

E assim será sempre na história, enquanto um homem tentar escravizar outro, por meio da força.
O Estado, as Nações, são as potenciações máximas dessa situação, por isso os desastres se dão em grande escala.

- Como aprender com a História e não repetirmos os mesmos erros?

É necessário primeiramente entender que politicamente apenas o conjunto de ações dos indivíduos arranjadas em prol de um objetivo são capazes de atingi-lo. É importante entender que a ignorância é o combustível dos atos desastrosos no mundo. Como diz um certo Sidarta: "não há uma luta entre o bem e o mal, mas sim um embate entre a sabedoria e a ignorância."

Por isso explicito aqui qual o nosso escudo perante o mal, a intolerância, a brutalidade no mundo. É a Razão. A luz da razão. É o estudo, a educação,  a reflexão, a Filosofia. Nessa ordem. Um povo ignorante, burro, é um povo fraco, manipulado, escravizado. A partir do funcionamento correto de nossas capacidades mentais, procurar o bem e encontrar as melhores atitudes à serem tomadas a fim de se produzir a maior quantidade de benefício. Seremos então aptos à defender nossos direitos e garantir o progresso e o crescimento.

Para garantir que isso não se repita, é necessário um esforço colossal para incitar a vibração do pensamento humano em inúmeras escalas, íntima, pessoal, da comunidade, e institucional, no qual a Escola e seguidamente a Academia, promovam a reflexão.

Por isso a importância da Filosofia, cada vez mais desprezada hoje. Ela é o instrumento, origem de todos os outros, sendo meio e não fim para atingirmos nossos objetivos. E qual poderia ser senão a felicidade?